quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Um Natal Diferente

Este desafio de Natal começou aqui pela mão magistral de Carlos Lopes, passou por mais uma quantas e veio cá parar vindo da mais bela laranja.

"As luzes de Natal iluminavam-lhe a cara e incendiavam-lhe as lágrimas com tonalidades de falsa animosidade natalícia... e eu não resisti a abraçá-la, à Inês, à minha filha que acabara de conhecer. A Teresa juntou-se a nós e senti-lhe o calor e o cheiro e voltei a desejar nunca a ter deixado de fora da minha vida."



Ficámos abraçados ainda durante algum tempo, matando as saudades do que nunca tiveramos. Depois elas recolheram aos quartos e eu, por fim, fi-lo também.

O quarto intacto desde há longos anos, o ligeiro cheiro a bafio no ar, a roupa da cama tão fria que parecia molhada... ou talvez não tivesse sido isso. Talvez fosse os próprios acontecimentos do dia. No mesmo dia, descobrir que se tem uma filha e que se vai ser avô, deixaria a cabeça num turbilhão a qualquer um e dificilmente conseguiria adormecer. Levantei-me, vesti o meu velho robe de xadrez e desci as escadas que rangeram no mesmo degrau que rangiam há 20 anos. Subitamente, foi como se não conseguisse respirar. O ar rarefeito, uma tontura, um mal-estar, um sabor acre na boca e lembrei-me do porquê ter partido, tantos anos antes. Passei a correr pelo alpendre envernizado, ajoelhei-me na neve e vomitei enquanto na testa gotas de suor escorriam. Senti vontade de novamente partir, de nunca ter voltado. Fugir e cortar para sempre as amarras que agora sabia ter naquele lugar. Mas como poderia fazê-lo? Voltei para dentro de casa, tomei um longo e quente banho e deitei-me no sofá em frente à lareira a ler um livro, um velho livro de Júlio Dinis, curiosamente entitulado "Serões da Província", até que adormeci.

Na manhã seguinte acordei bastante cedo e um pouco mais calmo. A noite havia sido boa conselheira. Fiz o pequeno-almoço para todos: panquecas, torradas, manteiga e doce na mesa; leite e café a fumegar em cima do fogão. Deve ter sido o cheiro a café fresco que acordou Teresa, pois surgiu no cimo das escadas nesse instante. Como em rapaz, o coração acelerou-se-me no peito e sorri, dizendo-lhe: "Estás deslumbrante neste Natal"! Enquanto isso, o tumulto dentro de mim serenou e soube que era ali que pertencia. Pertencia àquela casa, àquela família, ao lado daquela mulher maravilhosa que durante vinte anos me soubera esperar. Os olhos humedeceram-se com a certeza do que queria.

Só havia um problema: o meu trabalho era a mais de trezentos quilómetros dali, não poderia continuar a fazê-lo na aldeia e era demasiado novo para me reformar. Tinha tirado o dia 24 de férias, mas a 26 teria que voltar a apresentar-se. Teria que dizer-lhes a todos que no dia seguinte, dia de Natal, à noite, voltaria para casa. Larguei a caneca de café amargo que tinha na mão em cima da bancada, aproximei-me dela e beijei-a com o desejo que vinte anos podem carregar.

Este texto louco deve ser continuado neste mundo...

15 comentários:

Cati disse...

Minha linda... obrigada por teres depositado em mim a continuação... hoje já não tenho vista decente para ler isto decentemente - o sono, aiiiii, tanto sono...

Amanhã volto e comento condignamente.
Love u lots...

PS- Como é que eu vou descalçar a p"#$ da bota...

Wolf disse...

mas eu tenho, ehehehhe

ui, que as coisas começam a compor-se! e bem!

beijos!

quintarantino disse...

... este conto está muito mais catita que o meu anticonto de natal que hoje bloguei ... nem outra coisa seria de esperar ...

A Professorinha disse...

Ainda bem que não me calhou a mim continuar... é que é impossível fazer igual ou melhor!...

Beijinhos

Finding Essex disse...

E caímos na realidade... Falsa modéstia é vaidade, estiveste muito bem mesmo!

Beijos e bom Natal.

redjan disse...

sof: apenas te digo ... obrigado ... pelo mais alto toque à Sof... neste conto !Que bom teres entrado....

AmSilva® disse...

sim senhor, parabens!!
por falar em desafios tens por la um no diario, visita!!

P.S. a música está excelente!!

Dani disse...

Sofia, deste-lhe um toque de mestra!

Beijinhos.. e... ah! Pois é... temos mesmo de voltar ao trabalho depois do Natal, não é???

Anónimo disse...

Mais uma pausa (para o café) na história! Já estou a ver o filme...
Vamos ver se coincide.

Parabéns pela tua parte.

Beijinho

Francis disse...

merry christmas...have fun.

Carlos Lopes disse...

Muito bem sofia. Muito bem mesmo. Feito a ouvir um certo cd que eu cá sei??? ;-)

Hélder disse...

Uma continuação de mestre, muito bem!

SILÊNCIO CULPADO disse...

Uma história de muitos sentimentos. Com saudades, recordações, ilusões e, quem sabe, amor ainda e ressentimentos. Porque os caminhos levam-nos longe, seguem até aos horizontes mas têm pó e pedras mesmo quando os aplainamos.
E, como diz Franco Ferraroti: "a história das emoções é a história dos advérvios de tempo".
Um beijinho de Natal

Unknown disse...

Obrigada Sofia,
Deste-lhe um sentido lógico. E apesar da lógica não interessar aqui para nada... "pensaste-lhe" um dilema real e temporal (no tempo desta história).
Gostei muito desta parte.
Beijinho

Sophia disse...

gostei muito do início da história, mas como passei a correr (tipo foguetão...!) vou voltar novamente para ler como deve ser e fazer o merecido comentário. entretanto venho só desejar uma boa 6ta e um óptimo fim-de-semana e mandar uma bjoka